quarta-feira, 27 de abril de 2011

Liber tarde

O momento não é importante.
O que fica é o calor dos olhos parado atrás dos seus.
O dia corre mesmo com o relógio quebrado,
Mas a missa não é celebrada sem o badalar dos sinos.

Fica o cheiro da criança.
Fica o choro do primeiro dia.
O gozo da primeira transa jamais é esquecido,
Mesmo se a última carta foi escrita à faca.

O que importa são os abraços.
O mundo delira sem os delírios da carne.
Os homens se punem com açoites no banheiro,
Mas o tempo sai da aurora encostado noutro peito.

O agora nem sequer existe.
Legal é a crista da onda que não sabe onde nasceu,
Mas tem idéia de onde irá dormir.
O surfista costura a carne da água
E o halterofilista exala pedras de granizo.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

O resto não existiu (fragmento)

Uma senhora se senta na cozinha de sua casa e escreve, com letra insegura, em um caderninho que intitula de diário. Anos depois esse mesmo caderno será manuseado por seu neto e este, entre maravilhado e nostálgico, tenta compreender os motivos por que sua avó escreveu certas passagens de sua vida e omitiu outras que ele conhece de ouvir falar. Mais: pensa como ele pode reunir todos os fragmentos de vida que estão ali descritos e deles fazer algo.

Seu maior desafio: o material de que dispõe é muito diáfano e muito disperso. A avó trata de fatos distantes no tempo e aos quais esse neto esteve ausente porque nem sequer habitava este mundo. Como conhecerá ele o resto? Que será o resto? O resto não existiu. Essa é a premissa que rege seu trabalho. E uma vez que o resto não existiu, ele pode ser criado ou imaginado.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

A maré


amar é um suicídio
que se pratica
a dois.